Os peixes são tão sentimentais quanto os humanos e podem ter sentimentos como a depressão.

Esta pergunta não tem saído da minha cabeça desde que passei uma noite em um hotel observando um peixe Betta, que parecia muito triste. Seu nome era Bruce Lee, de acordo com um papel sob seu pequeno “aquário” globo. Estávamos tomando uma bebida no último dia de nossa lua de mel e lá estava o Bruce Lee, apenas um peixinho Betta, totalmente imóvel, sua nadadeira inferior pastando as rochas falsas claras no fundo de sua casa. Quando ele finalmente se moveu, apenas um pouco, eu tive a sensação de que ele preferiria estar morto, pareceria com depressão!

Peixe kinguio com caraterísticas de depressão (Créditos kelly.s/Flickr)

A funcionária na recepção me assegurou que ele estava sendo bem cuidado. Eu simplesmente me colocava na situação dele, assumindo incorretamente que sua letargia era um sinal de estresse mental? Quando busquei respostas de cientistas, assumi que achariam essa questão absurda. Mas eles não o fizeram. De modo nenhum.

Alguns cientistas consideram que o peixe é um modelo animal promissor para o desenvolvimento de antidepressivo e isso tem mudado radicalmente a maneira de como é vista a cognição dos peixes, construindo um caso em que o animal de estimação e o dono não são tão diferentes quanto muitos assumem. “A neuroquímica é tão parecida que chega a ser assustador“, disse Julian Pittman, professor do Departamento de Ciências Biológicas e Ambientais da Universidade de Troy, no Alabama, onde trabalha para desenvolver novos medicamentos para tratar a depressão com a ajuda de pequenos Paulistinhas (Danio rerio). Nós tendemos a pensar neles como organismos simples, mas eles têm muito mais a oferecer no qual não é dado o devido crédito.

Segundo a matéria, quanto mais o peixe se movimenta e explora a parte superior do aquário, significa que ele não está depressivo.

Segundo a matéria, quanto mais o peixe se movimenta e explora a parte superior do aquário, significa que ele está saudável.

O Dr. Pittman gosta de trabalhar com peixes, em parte, porque eles são tão óbvios quanto à sua depressão. Ele pode testar de forma confiável a eficácia dos antidepressivos com algo chamado de “novo teste de aquário“. Um paulistinha é solto em um novo aquário, se somente após cinco minutos, estiver saindo na metade inferior, está com depressão. Agora se está nadando em cima – é a inclinação usual ao explorar um novo ambiente – então não está. A gravidade da depressão, diz ele, pode ser medida pelo tempo no fundo do aquário, o que parece confirmar minhas suspeitas sobre Bruce Lee (o peixe Betta).

Bruce Lee, o peixe letárgico no quarto do hotel, estava mais rente ao substrato devido a depressão

Bruce Lee, o peixe letárgico no quarto do hotel, estava mais rente ao substrato devido a depressão. (Créditos Rolf Kopfle/Photolibrary)

Enquanto os cientistas tem usado animais como ratos, para estudar problemas emocionais por décadas, a relevância desses modelos para a experiência humana é incompleta na melhor das hipóteses. Há a questão óbvia de que “não podemos perguntar aos animais como eles se sentem“, diz o Dr. Diego A. Pizzagalli, diretor do Centro de Depressão, Ansiedade e Pesquisa de Estresse na Harvard Medical School. Embora os pesquisadores possam encontrar paralelos nas flutuações da serotonina e da dopamina, nem o peixe nem o rato podem “capturar todo o espectro de depressão conforme o conhecemos“, diz o Dr. Pizzagalli.

Segundo a matéria, quanto mais o peixe permanece na parte inferior, sem se movimentar, ele pode estar depressivo.

Segundo a matéria, quanto mais o peixe permanece na parte inferior, sem se movimentar, ele pode estar depressivo.

Há um grande debate na comunidade de pesquisa de peixes sobre se ansioso ou deprimido é um termo mais apropriado. Mas o que convenceu o Dr. Pittman e outros nos últimos dez anos, é a observação da forma como o paulistinha perde o interesse em praticamente tudo: comida, brinquedos, exploração – assim como pessoas clinicamente com depressão.

As pessoas com depressão são afastadas, sozinhas. O mesmo se aplica aos peixes – disse Culum Brown

Biólogo comportamental da Universidade Macquarie, em Sydney, que publicou mais de 100 artigos sobre cognição de peixes.

O gatilho para a maior parte da depressão doméstica dos peixes é provavelmente a falta de estimulação, disse Victoria Braithwaite, professora de pesca e biologia da Universidade de Penn State, que estuda informações e preferências de peixes. Estudo após estudo mostra como os peixes estão desafiando os estereótipos aquáticos: alguns peixes utilizam ferramentas e outros podem reconhecer rostos individuais.

Estamos descobrindo que os peixes são naturalmente curiosos e buscam coisas novas”, disse o Dr. Braithwaite. Em outras palavras, seu peixinho dourado provavelmente está aborrecido. Para ajudar a afastar a depressão, ela pede a introdução de novos objetos no tanque ou a mudança da localização dos itens. O Dr. Brown concorda, apontando para um experimento que ele conduziu, que se você deixar um peixe em um ambiente enriquecido e fisicamente complexo – com plantas e locais para explorar – diminui o estresse e aumenta o crescimento do cérebro.

Aquários pequenos são mais propicios a depressão dos peixes

Aquários pequenos são mais propícios a depressão dos peixes (Via Timmys World). Aquário redondo: Porque não usar e 10 alternativas mais adequadas.

O problema com pequenos aquários não é apenas a falta de espaço para a exploração, disse o Dr. Brown, mas também a qualidade da água que tende a ser instável e pode não haver oxigênio suficiente. “Um aquário-globo, por exemplo, é a pior situação possível“, disse ele. Se você possui um peixe, pode querer saber onde o Dr. Brown mantém o dele: um tanque de 180cm com muitas plantas. Ele recomenda um “aquário de 60cm com muitas plantas e distrações” para o seu Betta.

A última vez que um visitante postou o Bruce Lee no Instagram, ele estava bem e animado. Foi colocada uma planta em seu globo e talvez tenha fornecido o enriquecimento que ele estava precisando. Mas então, meu coração se partiu. Foram publicadas fotos de outro Bruce Lee no mesmo hotel que eu o havia encontrado, em várias cores – vermelho, azul e roxo.

[box type=”warning” align=”” class=”” width=””]O AquaA3 salienta a importância de monitorar o seu peixe. Cada espécie tem suas peculiaridades, algumas preferem estar mais no fundo, outras na superfície. Algumas são naturalmente mais ativas e outras se movimentam menos. Logo, observe se houve alguma mudança no perfil natural da espécie, antes de definir se o peixe está “desanimado”.[/box]

Nota do tradutor

Quando eu era criança, na visita nas lojas sempre via os Bettas naqueles aquários minúsculos quase sem movimento e apáticos, pareciam estátuas dentro daquela água. Nunca gostei dessa situação e sempre me perguntei: como ele pode ser feliz ali?

Muitas pessoas me param para conversar e sempre me perguntam: mas peixe não é meio sem graça? Ele não faz nada… Como eu sempre gostei do hobby, acabo tratando os peixes com muito mais cuidado e observação, e a prática diária do meu trabalho só comprova que são animais com muita inteligência, sentimentos e personalidade.

Essas pesquisas nos ajudam a comprovar isso e também a valorizar esses animais que, na maioria das vezes, são tratados como simples mercadorias e não como seres vivos que têm muito a nos ensinar.

Fonte: originalmente publicado no The New York Times com o título Fish Depression Is Not a Joke[link], traduzido e complementado por nossa equipe!